terça-feira, 4 de setembro de 2007

Existencialismo e a Paixão

A paixão é um sentimento de ampliação do amor. O acometido de paixão perde sua individualidade em função do fascínio que o outro exerce sobre ele. É tipicamente um sentimento doloroso e patológico, porque, via de regra, o indivíduo perde a sua individualidade, a sua identidade e o seu poder de raciocínio. Pode-se dizer também que paixão é algo muito mais passageiro, que após a paixão, vem o amor, que é um sentimento muito mais forte e duradouro. O existencialismo não acredita no poder da paixão. Ele jamais admitirá que uma bela paixão é uma corrente devastadora que conduz o homem, fatalmente, a determinados atos, e que, conseqüentemente, é uma desculpa. Ele considera que o homem é responsável por sua paixão. O homem faz-se a si próprio, é livre: tem total liberdade para escolher o que se torna, é responsável por sua paixão. Assim, não há nada que justifique seus atos. O homem está desamparado, condenado à sua própria escolha. E se escolher se apaixonar e sofrer terá que tolerar as conseqüências dessa sua escolha. Cada indivíduo faz seu futuro da sua maneira; ele escolhe aquilo que quer passar durante sua vida.

Educação

As esperanças na educação como fonte transformadora do homem e da sociedade é uma idéia de força, quase consensual. É verdade que muitos já não lhe atribuem o caráter "civilizador" que inicialmente as pessoas lhe davam, numa época em que se afirmava que "abrir uma escola era fechar uma cadeia". Somos hoje mais cautelosos no poder do ensino e, principalmente, mais descrentes em relação à capacidade da escola para a superação das desigualdades e resolução dos "males" que afligem a sociedade. Isso ocorre devido a muito discurso, muita promessa, mas nenhuma mudança significativa ou conseqüente na esfera da educação brasileira, principalmente no que se refere às condições para a produção do ensino. Entra governo, sai governo e essas condições deterioram cada vez mais. Revolta em educação é uma espécie de “livro-antena”, que busca captar e expressar os sentimentos dos profissionais da educação nos últimos tempos. As charges têm como objetivo aumentar ainda mais a densidade das denúncias e, ao mesmo tempo, conseguir o famoso efeito do “rir para não chorar”. De fato, as contradições são tão visíveis que só não chora quem estiver totalmente apático frente a um irreversível holocausto em câmara lenta. No sistema de pensamento de Sartre, a educação é entendida e praticada apenas como meio de doutrinação errada de uma modalidade. O indivíduo, por imposição legal, é obrigado a freqüentar a escola; é submetido a um currículo e a uma disciplina; é forçado a fazer exames, entre outras coisas. Do seu ponto de vista, tais práticas significam uma violência sobre a verdadeira liberdade e existência do indivíduo. Segundo o crítico Khemais Benhamida - baseia-se na natureza completamente subjetiva do "projeto" sartreano, no qual o outro aparece como limite da minha liberdade - Sartre vê as relações humanas como necessariamente hostis. Essa hostilidade se inicia na idéia do que é um ser humano e do que é o outro. Para o filósofo, o ser humano é liberdade. O ser humano, que existe, nada mais é do que um sujeito que organiza objetos a seu redor como tentativa de realizar intentos livremente escolhidos. Com a entrada do "Outro", essa liberdade sofre limitação. O relacionamento humano é intrinsecamente conflituoso. Alega-se que o conflito se agrava pelo fato de que, no esquema sartreano, é impossível dois sujeitos compartilharem um ponto de vista comum. Como representam dois projetos inteiramente diferentes, não há qualquer comunhão e só o conflito se faz possível. Se assim for, então, nas escolas, a figura do professor não teria muita utilidade, pois seu papel principal é facilitar a aprendizagem ou a construção de opções melhores por parte do aluno. Uma relação assim facilitadora, sugereria o crítico, possibilitando os relacionamentos positivos e chegando-se a opiniões comuns e, portanto, a um entendimento compartilhado. Mas na visão de Sartre, o educador teria um único objetivo natural e uma proposta para ser aplicada: auxiliar o estudante a ser ele mesmo, a ser livre.
"O grande segredo da educação consiste em orientar a vaidade para os objetivos certos."
(Adam Smith)

segunda-feira, 3 de setembro de 2007

Ciência e Existencialismo

A ciência, em geral, ocupa-se das substâncias, deseja conhecê-las, defini-las e catalogá-las. Com isso realizado, trata de apontar leis, desenvolver teorias e criar sistemas que se articulam na intenção de uma previsibilidade racional supostamente perfeita. Dentro das ciências, o importante é selecionar fenômenos que pudessem ser classificados e controlados para daí chegar a explicar e prever a realidade. A grande questão é que se abre um abismo imenso entre a verdade matemática e a lógica das ciências e a realidade existencial das pessoas. A existência humana não pode ser reduzida à definição e classificação da substância orgânica que compõe o corpo do homem e do seu comportamento aparente. O homem é emergente, pulsante. O existencialismo não nega os fatores biológicos e sociais, porém coloca o homem como ser responsável e livre para lidar com estes aspectos que também fazem parte de sua realidade.

Durante a metade do século XIX, filósofos quiseram estudar a natureza humana, aplicando métodos científicos para a observação, registro e tratamento do comportamento humano. Eles criaram que se o ser humano pudesse ser estudado sob uma perspectiva comprovadamente científica, sem dúvida teríamos uma fórmula precisa para entender o comportamento presente, predizer o comportamento futuro e alterar os possíveis desvios provenientes da utilização de ferramentas científicas. Poderiam ser utilizadas a psicologia, em seu maior expoente e a psicoterapia que tem-se engajado em uma postura científica. A última é a que mais se relaciona com o existencialismo, principalmente no seu ramo de Psicoterapia Existencial, ou seja, investigação do indivíduo na busca de lhe fazer sobressair ou revelar, livremente, o que nele há de individual, particular, único e concreto; é a busca de sua auto-expressão mais autêntica e do compromisso sincero com as próprias escolhas existenciais. Na visão de Rollo May (psicólogo existencialista), os dois estudos analisam os indivíduos em crise. A proposta básica é a de buscar a verdade por pior que seja, pois a verdade sempre deixa o sujeito mais sólido e íntegro.

A verdadeira ciência defende que o estudo, a tecnologia e a inovação são recursos indispensáveis para o desenvolvimento, pois ela habilita as pessoas para o uso de conhecimentos científicos básicos para compreender e tomar decisões a respeito do mundo natural, além disso, as capacita a reconhecer questões científicas, usar evidências e chegar a conclusões de tipo científico, no entanto, o homem não pode chegar a conclusões universais, pois cada indivíduo é diferente do outro, assim possui atitudes diferentes e tem liberdade para tal. Não é através de evidências que o homem chegará a reais definições, mas através do estudo profundo de cada ser individualmente. A evolução tecnológica, por exemplo, não é nada mais do que escolhas de homens que fizeram para si o que lhes parecia interessante, o que ocasionou na evolução de toda sociedade, mas, ainda assim, partiu de escolhas individuais.

domingo, 2 de setembro de 2007

Comportamentos Humanos sob visão Existencialista

VIOLÊNCIA
A violência está em toda parte. Não podemos passar um dia sem ouvir uma notícia sobre atos violentos nos meios de comunicação. Entretanto, mesmo ocorrendo em nosso país, em nossa cidade, em nosso bairro, a questão pode ficar um pouco distanciada e acadêmica até que somos vítimas da violência, ou alguém próximo a nós sofre algum tipo de agressão. Assaltos são cada vez mais comuns, seqüestros já fazem parte do nosso cotidiano e ela só tende a se alastrar.
A violência é objeto de numerosas análises sociológicas, que nos trazem informações no sentido de que o caminho que leva à marginalidade parece não ser traçado por uma categoria particular de homens, mas sim por todo um conjunto de problemas estreitamente relacionados com condições de habitação subumanas, crises sociais, um sentimento generalizado de alienação e de isolamento e, acima de tudo, pela discriminação feita pelas pessoas do seu meio que representam a sociedade.
Porém, se a questão da violência for analisada através do existencialismo pode-se concluir que suas proporções são resultados, somente, das atitudes humanas. Se o homem realmente é responsável por aquilo que é e somente ele cria seu destino, não significa que ele é responsável por sua única individualidade, mas que é responsável por todos os homens, então não há nenhum outro fator que tenha gerado a violência senão o egoísmo do próprio homem. Ele está lançado em um mundo no qual se lhe apresentam diversas alternativas com as quais ele tem que lidar ante as quais ele deve decidir, entretanto, se ele não possui certeza de suas escolhas pode buscar saídas erradas lhe mostram se verdadeiro “eu” e acabe afetando outros homens a sua volta. Ao invés de conquistar um futuro melhor, o indivíduo se identificará com um modelo da sociedade atual, criada por ele próprio, e se deparando com uma sensação de perda do sentido vital.
A única esperança está na ação do homem, pois somente ela que o permite viver. Então se todos os homens esperam que uma sociedade seja construída com valores de paz e amor e que a violência seja abolida, basta que pratiquem atos que confirmem esses valores. Todavia, a liberdade para Sartre é o mesmo que o poder de negar, ou que, ser consciente é ser livre. Sendo assim a responsabilidade sobre a existência de cada individuo é dele próprio, pois se o individuo é ou está consciente, tem sua liberdade e tendo sua liberdade pode negar a realidade, negando a realidade está possibilitando a si mesmo fazer novas escolhas (certas ou erradas) e escolher é antes de qualquer coisa, ser autêntico em vida.

Existencialismo e Deus

Sartre defende o existencialismo contra os católicos afirmando que esta é uma doutrina que torna a vida humana possível graças à subjetividade humana. Sartre ainda especifica a diferenciação entre as duas escolas do existencialismo, a dos existencialistas cristãos Jaspers e Marcel e os ateus Heidegger e o próprio Sartre, afirma que a única coisa que une estas duas correntes é que a existência precede a essência. Ou se preferir é necessário partir da subjetividade.
O existencialismo ateu afirma que, se Deus não existe há pelo menos um ser no qual a existência precede a essência, um ser que existe antes de poder ser definido por qualquer conceito. Este ser é o homem, ou melhor, a realidade humana. Isto significa que, em primeira instância , o homem existe, surge no mundo e só posteriormente se define.
O homem, tal como o existencialista o concebe, só não é passível de uma definição porque, de início, não é nada; só posteriormente será alguma coisa e será aquilo que ele fizer de si mesmo. Assim, não existe natureza humana, já que não existe um Deus para concebê-la.
O homem é aquilo que ele mesmo faz de si, é a isto que chamamos de subjetividade. Porém, se realmente a existência precede a essência, o homem é responsável pelo que é. Desse modo, o primeiro passo do existencialismo é de por todo o homem na posse do que ele é de submetê-lo à responsabilidade total de sua existência.
Ao afirmarmos que o homem se escolhe a si mesmo, queremos dizer que cada um de nós se escolhe, e também escolhe todos os homens.
O existencialista, pensa que é extremamente incômodo que Deus não exista, pois, junto com ele, desaparece toda e qualquer possibilidade de encontrar valores num céu inteligível; não pode mais existir nenhum bem a priori; já que não existe uma consciência infinita e perfeita para pensá-lo.
Se Deus não existe, não encontramos já prontos, valores ou ordens que possam legitimar a nossa conduta. Assim não teremos nem atrás nem a frente nenhuma justificativa para nossa conduta. Estamos sós, sem desculpas. É o que se pode expressar dizendo que o homem está condenado a ser livre. Condenado, porque não se criou a si mesmo, mas por estar livre no mundo, está condenado a ser livres.
O existencialista não pensara nunca que o homem possa conseguir o auxilio de um sinal qualquer que o oriente no mundo, pois é o homem quem decifra os sinais.
Então, segundo Sartre, o homem está abandonado; Deus não existe e, a não-existência de Deus tem implicações extremadas. Aliás, alguns dos problemas principais que se levantam do abandono parecem também levantar-se meramente do fato de nós não podermos saber se Deus existe. Se Deus realmente existe, nós "não estamos abandonados". O problema do abandono levanta-se meramente do fato de nós não podermos saber se Deus existe.
Sua existência em tais condições equivale, para Sartre, em uma não-existência efetiva, que tem implicações drásticas. Primeiro, porque não há Deus, não há nenhum criador do homem e nem tal coisa como um concepção divina do homem de acordo com a qual o homem foi criado. Segundo, diz ele, louvando-se em Dostoiévski (na fala de Ivan Karamazov, na famosa novela daquele escritor russo): Se Deus não existe, então tudo é permitido. Terceiro, "Não há um sentido ou propósito último inerente à vida humana; a vida é absurda".
Isto significa que o indivíduo, foi jogado de fato na existência sem nenhuma razão real para ser. "Simplesmente descobrimos que existimos e temos então de decidir o que fazer de nós mesmos.".
Resta como o único valor para o existencialismo ateu a liberdade. Afirma que não pode haver uma justificativa objetiva para qualquer outro valor. Porque não há nenhum Deus, não há nenhum padrão objetivo dos valores. Com o desaparecimento dele, desaparece também toda possibilidade de encontrar valores. Não pode então haver qualquer bem a priori porque se nós não sabemos se Deus existe, então nós não sabemos se há alguma razão final porque as coisas acontecem da maneira que acontecem; não há nenhuma razão final porque qualquer coisa tenha acontecido ou porque as coisas são da maneira que elas são e não de alguma outra maneira e nós não sabemos se aqueles valores que acreditamos que estão baseados em Deus têm realmente validade objetiva. Consequentemente, porque um mundo sem Deus não tem valores objetivos, nós devemos estabelecer ou inventar, a partir da liberdade, nossos próprios valores particulares. Na verdade, mesmo se nós soubéssemos que Deus existe e aceitássemos que os valores devessem basear-se em Deus, nós ainda poderíamos não saber que valores estariam baseados em Deus, nós poderíamos ainda assim não saber quais seriam os critérios e os padrões absolutos do certo e do errado. E mesmo se nós sabemos quais são os padrões do certo e do errado (critérios), exatamente o que significam ainda seria matéria da interpretação subjetiva. E assim o dilema humano que resultaria poderia ser muitíssimo o mesmo como se não houvesse Deus.

O Existencialismo e a Liberdade

Liberdade

A Liberdade relaciona-se sempre com a Ação, está ligada à conduta do Homem. Uma ação livre é uma ação consciente e responsável, em que o agente pode responder, ou seja, ser responsabilizado pela ação que comete. Daqui pode deduzir-se que a Liberdade e a Responsabilidade estabelecem uma relação direta, na medida em que quanto mais livre se é, mais responsável se é, e o inverso também se verifica. A Liberdade é uma característica antropológica fundamental, visto estar ligada à aparição do Homem na Terra. A realidade humana nasce de uma tomada de consciência, o que nos leva a crer que a nossa Liberdade tem o seu lugar na nossa consciência. Pode assim afirmar-se que o espaço da Liberdade é um espaço mental. Nós, à medida que vamos crescendo e evoluindo enquanto indivíduos e seres humanos, vamos ganhando consciência da nossa Liberdade. Além disso, também vamos evoluindo e construindo a nossa Moral, vamos clarificando, ao longo da nossa vida, o que é certo ou errado, o que é o certo ou errado, o que é o bem e o mal. Sendo assim, a Moral não é possível sem a Liberdade, porque sem Moral não podemos fazer opções, e se não podemos optar então é porque não somos livres. A Moral ocupa-se da nossa Liberdade.

A existência é modo de ser finito e é possibilidade, isto é, um poder-ser. A existência, precisamente, não é essência, coisa dada por natureza, realidade predeterminada e não modificável . As coisas e os animais são o que são e permanecem o que são. Mas o homem será o que ele decidiu ser. O seu modo de ser, a existência, é um sair para fora em direção à decisão e à automoldagem. Assim, a existência é um poder-ser e, portanto, é incerteza, problematicidade, risco, decisão, impulso adiante.
O ser-em-si só pode descrever-se analiticamente como "o ser que é aquilo que é". Relativamente ao ser-em -si, a consciência é o ser-para-si; isto é, presença a si mesma. A presença a si mesma implica sua cisão, uma separação interior no ser da consciência. A consciência está no mundo, no ser-em-si, mas é radicalmente diferente do mundo, não está ligada ao mundo. A consciência, que vem a ser a existência, isto é, o homem, é portanto, absolutamente livre. O ser-em-si é o ser que é o que é; a consciência não é objeto. O ser pleno e completo; a consciência é vazia de ser, é possibilidade, e a possibilidade não é realidade. A consciência é liberdade.
A liberdade, segundo Sartre , é a possibilidade permanente daquela ruptura ou nulificação do mundo que é a própria estrutura da existência. "Eu estou condenado, a existir para sempre para além da minha essência, para além dos móbiles ou moventes e dos motivos do meu ato: eu estou condenado a ser livre." Isto significa que não se pode encontrar para a minha liberdade outros limites além da própria liberdade: ou, se se preferir, que não somos livres de deixar de ser livres. A liberdade não é o arbítrio ou o capricho momentâneo do indivíduo: radica na mais íntima estrutura da existência, é a própria existência. Um existente que, como consciência, está necessariamente separado de todos os outros, já que esses se encontram em relação com ele apenas na medida em que existem para ele, um existente que decide do seu passado, sob forma de tradição, à luz do seu futuro, em vez de deixá-lo pura e simplesmente determinar o seu presente, um existente que se perspectiva através de algo distinto de si, isto é, de um fim que não é e que ele projeta no outro lado do mundo, eis aquilo a que chamamos um existente livre. É evidente que a liberdade não se refere tanto aos atos e às volições particulares como ao projeto fundamental em que eles se encontram compreendidos, o qual constitui a possibilidade última da realidade humana, a sua escolha originária. O projeto fundamental deixa sem dúvida uma certa margem de contingência às volições e aos atos particulares, mas a liberdade originária é aquela que é inerente à escolha do próprio projeto. E é uma liberdade incondicionada. A modificação do projeto inicial é a todo momento possível. A angústia que, quando revelada, manifesta à nossa consciência a nossa liberdade, testemunha a modificabilidade perpétua do nosso projeto inicial. Nós estamos perpetuamente ameaçados de nulificação da nossa escolha atual, perpetuamente ameaçados de escolhermos ser, e portanto tornar-mo-nos, diferentes do que somos. A nossa escolha é frágil pelo simples fato de ser absoluta: assentando sobre a escolha a nossa liberdade, colocamos simultaneamente a sua perpétua possibilidade de tornar-se um aquém ultrapassado pelo além que eu serei. Certamente, a liberdade do projeto inicial não é a possibilidade de fugir ao mundo e anular o próprio mundo. Se a liberdade significa fugir ao dado ou ao fato, ela é o fato do fugir ao fato. A liberdade permanece nos limites da fatualidade, isto é, do mundo. Mas esta fatualidade é indeterminada: a liberdade põe o mundo em ser com a sua escolha. Por isso o homem é responsável pelo mundo e por si mesmo enquanto maneira de ser. Tudo o que acontece no mundo reporta-se à liberdade e à responsabilidade da escolha originária; por isso, nada daquilo que acontece ao homem pode ser dito inumano. As mais atrozes situações da guerra, as piores torturas não criam de fato um estado de coisas inumano. Não existe aí uma situação inumana: somente pelo medo, pela fuga ou pelo recurso a comportamento mágicos, decidiremos sobre aquilo que é inumano; mas esta decisão é humana e dela terei inteira responsabilidade. Sou eu que decido sobre a adversidade das coisas e até da sua imprevisibilidade decidindo de mim própria. Não existem casos acidentais: um acontecimento social que ocorre subitamente e me arrasta não é exterior a mim; se sou mobilizada para uma greve, esta é a minha greve, a minha própria imagem, e eu mereço-a. Mereço-a por que a escolhi, trata-se sempre de uma escolha.
É o homem que se escolhe: a sua liberdade é incondicional e ele pode mudar seu projeto original ou inicial a qualquer momento. O homem e só o homem é o ser para o qual todos os valores existem.
As coisas do mundo são gratuitas e um valor não é superior a outro. As coisas são desprovidas de sentido e fundamento e as ações dos homens são desprovidas de valor. Em suma, a vida é uma aventura absurda, onde o homem se projeta continuamente além de si mesmo, como para tornar-se deus. Escreve Sartre: "o homem é o ser que projeta ser Deus, mas, na realidade, ele se mostra como aquilo que é uma paixão inútil”.
O homem é fundamentalmente desejo de ser Deus. Deus não é senão este desejo mal sucedido. O ser-em-si do mundo e o ser-para-si da consciência se encontram num estado de perpétua ruptura com relação a uma síntese ideal que jamais existiu, mas que é sempre indicada, embora sempre impossível.
A liberdade consiste na escolha do próprio ser. E essa escolha é absurda. Assim o existencialismo sartreano afirmava a realidade dos homens, através da consciência como liberdade.

DETERMINISMO X EXISTENCIALISMO

A tese do Determinismo, defendida por Bento de Espinosa, afirma que nada pode acontecer para além do que acontece, porque todos os acontecimentos são o resultado necessário de causas que os antecederam – que eram, elas mesmas, o resultado necessário de causas que as antecederam.
O Existencialismo, defendido por Jean-Paul Sartre, como dissemos, é a corrente filosófica que começa com o contingente da existência do ser humano individual e considera-a o principal enigma.
  • Espinosa acredita que Deus existe e que tudo é natureza de Deus, Sartre não crê na existência de uma entidade superior e exterior ao ser senão aquilo que ela determina; no entanto, Sartre afirma que, pelo facto de não existir Deus, o homem está condenado a criar-se a si próprio, é ele que decide ser como ele deseja ser.
  • Espinosa acredita que nos regemos pelas leis da natureza e que o único fim desta é o de autoconservar-se. Sendo assim, ele acredita que a “ natureza humana” existe, sempre existiu e sempre existirá (é a essência do homem). Sartre porém, não acredita nas existências de leis exteriores ao próprio homem, e, por isso, afirma que antes de o homem existir não existe “realidade” ou “natureza humana” (daí o principio a essência precede a existência), pois esta não é nada antes de o homem existir. Com efeito, o homem tem de criar-se a si próprio e ser responsável pela sua criação, não podendo furtar-se a essa responsabilidade, desculpando-se com a “natureza humana”.
  • No que respeita aos valores do Bem e do Mal, Espinosa considera que o Bem visa a autoconservação do ser e é útil à razão, e o Mal é o que prejudica essa autoconservação e nos impede de compreender. Para Sartre, nenhum valor é eterno e universal; cada homem cria esses valores para si.
  • A plenitude da liberdade humana, segundo Espinosa, é atingida através do conhecimento de Deus, na compreensão das emoções e da consequente libertação da acção destas; Sartre, ao invés, acredita no livre arbítrio (liberdade de escolha), que a liberdade é o fundamento de todos os valores e que o homem não tem outra alternativa senão ser livre e procurar e usar essa liberdade.
  • Espinosa pensa que os actos do homem são determinados por causas exteriores a ele, que escapam ao seu controlo, e só se liberta quando compreender e aceitar as coisas tal como elas são. Para Sartre, o homem é obrigado a fazer escolhas, precisamente por não existirem leis que ditem o que ele vai ser e como terá de agir.
  • Enquanto Espinosa defende que é a razão que nos guia e, por isso mesmo, defende a liberdade de pensamento, Sartre considera que é através da ação que a liberdade se exprime.

Existencialismo e Homossexualidade

“Homossexualidade é o atributo, a característica ou a qualidade daquele ser — humano ou não — que é homossexual (grego homos = igual + latim sexus = sexo) e, lato sensu, define-se por atração física, emocional, estética e espiritual (caso especificamente humano) entre seres do mesmo sexo, com eventual inversão de papéis de gênero (caso especificamente humano, dado poder este compreender intelectivamente o que isso — gênero e sua inversão de papéis — significa).” (Origem: Wikipédia, a enciclopédia livre)

Existem duas linhas de pensamento sobre a existência humana: o essencialismo e o existencialismo. O essencialismo, ilustrado pela Teoria do Mundo das Idéias de Platão, assume uma natureza humana, representada através de modelos que orientam o comportamento dos homens. A vida social, organizada segundo esse princípio, é construída através de vários modelos ideais, que servem à pratica cotidiana: há uma maneira ideal de ser trabalhador, cidadão ou estudante. No campo da sexualidade, esses modelos são dois, relacionados exclusivamente ao fator biológico: o sexo masculino e o feminino, que ditam a existência como homem ou mulher. Tudo o que existir além disso é encarado como transgressão do modelo.

Na sociedade de hoje, é comum a liberdade de escolha do homossexual esbarrar em preconceitos formados a partir de uma idéia fixa e imutável do que vem a ser homem e mulher. A sociedade em geral reproduz o pensamento essencialista, expresso em atos de violência psicológica, por meio de variadas atitudes preconceituosas.

Outros grupos não correspondentes ao modelo historicamente adotado pelo ocidente (masculino, branco, trabalhador, educado, rico, fisicamente e intelectualmente "normal") são, da mesma forma, alvos de discriminação por uma parcela significativa da sociedade que mantém critérios de avaliação moral a partir de modelos essencialistas. Curiosamente, muitos nem são "boas cópias" dos modelos com que julgam os outros.

Assim, negros, mulheres, nordestinos, desempregados, pobres são cópias imperfeitas do modelo idealizado para uma sociedade fundada em valores mercadológicos. Há, portanto, um caráter ideológico (e não real) na construção dessas essências - masculina e feminina, no caso - que se amoldam oportunamente aos interesses do poder machista, na história ocidental. Prova disto é que podemos notar uma pequena quebra em tais modelos a partir do momento que alguma dessas categorias desprezadas historicamente interessem de alguma maneira ao mercado consumidor: os homossexuais já se configuram como um nicho consumidor a ser explorado pelo mercado.

A partir da concepção existencialista de Sartre que diz que "a existência precede a essência", podemos entender que, ao falarmos em homossexualidade, não estamos falando de um comportamento "desvirtuado" de um padrão, e sim de uma possibilidade existencial entre outras. Não há nada que determine definitivamente e a priori um comportamento sexual. Este é construído a partir de condições concretas e de escolhas no percurso da existência. O Existencialismo vê uma distinção, portanto, em dois aspectos que o senso comum tem como únicos: há fisicamente o sexo masculino e o sexo feminino, porém, são diversos os projetos de existência do que é ser homem ou mulher.

Pelo primeiro princípio do Existencialismo: *“O homem nada mais é do que aquilo que faz de si mesmo. É o que chamamos de subjetividade. O homem será apenas o que ele projetou ser, não o que ele quis ser. O homem é responsável pelo o que é. Escolher ser isso ou aquilo é afirmar o valor que estamos escolhendo.”* (O Existencialismo é um Humanismo) Logo, o único responsável pela sua escolha sexual é o próprio indivíduo, que forma a sua essência, através se suas ações, escolhas e projeções.

quinta-feira, 30 de agosto de 2007

O que é o Existencialismo??

Corrente filosófica que se funda na situação do indivíduo vivendo num universo absurdo, ou sem sentido, em que os homens são dotados de vontade própria. Os existencialistas sustentam que as pessoas são responsáveis pelas suas próprias ações, e o seu único juiz, na medida em que a sua existência afeta a dos outros. A origem do existencialismo é geralmente atribuída ao filósofo dinamarquês Kierkegaard. Entre os seus outros proponentes destacam-se Martin Heidegger, na Alemanha, e Jean-Paul Sartre, na França. Todos os indivíduos dotados de autoconsciência podem compreender ou intuir a sua própria existência e liberdade, daí que não devam deixar que as suas escolhas sejam limitadas por nada - nem pela razão, nem pela moral. Esta liberdade para escolher conduz à noção de "não-ser", ou "nada", que pode provocar a angústia ou o medo. O existencialismo possui muitas variantes. Kierkegaard salientou a importância da escolha pura na ética e na crença cristã, Sartre procurou combinar o existencialismo com o marxismo (doutrina de Karl Marx, que abarca o materialismo histórico e o dialético e a aplicação de ambos à vida social). O pensamento filosófico dos autores existencialistas não se caracteriza nem por uma sistematização racional sobre a vida nem por reflexão abstrata acerca do ser humano. O homem é o problema central do existencialismo, não enquanto ser abstrato, com uma natureza definida, mas como um ser concreto, que sofre, que trabalha e ama. Para os filósofos existencialistas contemporâneos, a existência humana é entendida como algo fluído e rico e, por isso, escapa a todas as sistematizações abstratas. Assim, para estes autores, acima de tudo a vida é para ser vivida. Faz parte inerente da existência humana o dever, a inquietação, o desespero e a angústia. A existência é algo em aberto, sempre em mudança, e não há nenhum tipo de determinismo ou fatalismo. A negação de um destino faz da vida um jogo de possíveis entre possíveis. Cabe ao homem, a cada instante, escolher, optar e, por isso mesmo, ele torna-se um ser responsável pela sua vida. A escolha humana traz consigo inevitavelmente a angústia e muitas vezes o desespero. Para os existencialistas, o indivíduo não pode ser diluído e apagado num todo, uma vez que cada um é um ser concreto, único e de valor insubstituível. Por isso, nesta reflexão, o homem é sempre entendido como um ser individual e concreto, na sua vida quotidiana, no seu contexto particular, e nunca entendido como uma entidade metafísica e abstrata. Nesta medida, os autores existencialistas são aqueles que colocam a existência do homem no plano central das suas reflexões, como dirá Sartre, “a existência precede a essência”. O homem à partida não está definido, ele é um projeto em construção, cada pessoa é aquilo em que se torna consoante aquilo que faz.
(R.Jolivet, As Doutrinas Existencialistas)